Trabalhadores remotos podem se sentir mais engajados por ter mais autonomia; por outro lado, funcionários totalmente remotos têm maior probabilidade de relatar sentimentos de raiva, tristeza e solidão

Uma pesquisa global da consultoria Gallup aponta que funcionários que trabalham totalmente remoto apresentam, por um lado, mais engajamento, mas, por outro, menos bem-estar.
Os dados são da última versão do relatório State of the Global Workplace, divulgado neste ano 2025.
O estudo aponta que trabalhadores totalmente remotos são os mais propensos a estar engajados no trabalho (31%) na comparação com trabalhadores híbridos (23%), presenciais com função remota possível (23%) e presenciais sem função remota possível (19%).
O engajamento mede o entusiasmo que os trabalhadores sentem pelo que fazem e o vínculo com sua equipe e organização.
A consultoria aponta que trabalhadores remotos podem se sentir mais engajados por ter mais autonomia, possibilitando que usem melhor seus pontos fortes, entrem mais facilmente em estado de fluxo e utilizem o tempo com mais eficiência.
O outro lado da moeda mostra que funcionários totalmente remotos têm maior probabilidade de relatar sentimentos de raiva, tristeza e solidão do que trabalhadores híbridos e presenciais.
O estudo aponta, por exemplo, que eles têm mais probabilidade de dizer que sentiram muito estresse no dia anterior (45%) do que trabalhadores presenciais (39% com função remota possível, 38% sem função remota possível), apresentando níveis de estresse semelhantes aos dos trabalhadores híbridos (46%).
Segundo a Gallup, esses resultados sugerem que ser totalmente remoto costuma ser mais desgastante mental e emocionalmente do que trabalhar no modelo presencial ou híbrido.
A consultoria cita fatores que podem explicar esse padrão:
1 – Distância física pode criar distância mental
Para alguns empregados, trabalhar remotamente pode parecer “apenas trabalho”, sem amizades, almoços em grupo, histórias compartilhadas e companheirismo que o modelo presencial ou híbrido oferece. O isolamento pode aumentar a solidão e, sem apoio social, contribuir para tristeza e raiva. Segundo a consultoria, compartilhar refeições é um indicador de bem-estar tão forte quanto a renda.
2 – Autonomia pode gerar estresse
Embora a autonomia aumente o engajamento ao dar mais controle sobre o tempo, excessivamente, ela pode gerar estresse. Gerenciar o próprio tempo e coordenar atividades com outras pessoas pode ser difícil sem limites claros.
3 – Tecnologia pode frustrar
A colaboração por tecnologia digital nem sempre é fluida, e a frustração varia conforme a tarefa. Funcionários remotos também podem ter menos acesso a recursos e equipamentos disponíveis para quem está no escritório.
Qual o desafio para as empresas?
Para Ricardo Guerra, CEO do Wellhub no Brasil, as empresas precisam oferecer flexibilidade.
“O principal ponto é que tudo que é absoluto tem um desafio. Uma das coisas que a gente entende cada vez mais é que no mundo moderno é preciso escutar as pessoas. A empresa precisa estar aberta e deve ter o máximo de modelos flexíveis a acomodar a cultura da empresa com o perfil dos profissionais. E, obviamente, a partir daí construir uma cultura saudável. Quando a empresa escolhe um modelo ou outro híbrido, presencial ou remoto, ela tem que adaptar a sua cultura para acomodar esse modelo. Mesmo a empresa que escolha cinco dias por semana, ainda diria que é importante dar mais dias ou períodos para que as pessoas possam adequar suas rotinas. Por exemplo, em vez de fazer todo mundo chegar às 9 horas, é possível trabalhar com outros horários para escapar de trânsito. Deixar dias que a pessoa pode chegar no meio do dia em vez de ficar no dia inteiro. Há vários modelos diferentes”, afirma Guerra.
A pesquisa Panorama do Bem-Estar Corporativo 2025, realizada pelo Wellhub (antigo Gympass) com mais de 5.000 profissionais em dez países, mostra que 86% dos trabalhadores consideram o bem-estar tão importante quanto o salário e 89% deles afirmam que, quando priorizam o bem-estar, têm melhor desempenho no trabalho.
No Brasil, os números são 89% e 94%, respectivamente.
O levantamento apontou ainda que apenas 17% concordam plenamente que o bem-estar faz parte da cultura de suas empresas (22% no Brasil), sendo que 81% acreditam que a empresa tem a responsabilidade de ajudar a cuidar do bem-estar (69% no Brasil).
“Os profissionais acham que poucas empresas fazem, mas a maioria tem certeza que a empresa deveria fazer mais. Se não tem esse diálogo, a percepção piora. Quando a percepção piora, o trabalhador se distancia. Esse é um dos grandes desafios”, diz Guerra.
Para ele, o ambiente de trabalho hoje é muito melhor do que há 20 anos, com mais programas de bem-estar, segurança psicológica, confiança, respeito e diversidade.
Porém, as questões sociais também se intensificaram.
“O ambiente profissional melhorou significativamente. O grande desafio é que a sociedade apresenta um grau mais complexo para os seus cidadãos, seja através de novas ferramentas, como redes sociais e telas, a trânsito, insegurança, entre outros desafios que tornam esse bem-estar mais desafiador. Acho que as empresas têm um papel grande aí”.
Engajamento e bem-estar juntos, sustentam o desempenho de longo prazo e o compromisso com o trabalho, aponta a Gallup.
Globalmente, 57% dos trabalhadores totalmente remotos estão buscando ativamente ou observando passivamente novas oportunidades de emprego.
Entre os totalmente remotos engajados, esse número cai para 47%.
Quando trabalhadores totalmente remotos estão engajados e prosperando, apenas 38% dizem que procuram uma nova oportunidade.
Ao apoiar tanto o engajamento quanto o bem-estar, as empresas podem proteger sua força de trabalho.
Para Guerra, as pessoas gostam de sentir que fazem parte de uma cultura e de uma organização que olha para ela como indivíduo, que respeita as suas diferenças, as suas vidas.
E para as empresas, isso significa mais retorno.
Dentro do que nós já medimos, a gente já percebeu que empresas que oferecem mais bem-estar aos trabalhadores, faltam menos ao trabalho, ficam mais tempo na empresa ou seja, o turnover é menor, tem menos custos de saúde, estão mais tempo felizes e estão mais tempo aptos a produzir.
Então, o bem-estar, assim como cuidar da saúde, assim como cuidar para que as pessoas sejam felizes, já se sabe que traz um resultado melhor para as companhias”, afirma Guerra e Silânia Costa.
Mas, não basta apenas implementar diversos programas de bem-estar. É importante medir os resultados que eles estão trazendo. “Não é só criar programas para acrescentar na lista de benefícios. Você precisa garantir que os profissionais, na cultura que você tem na empresa, estão aderindo a isso. Já não tem mais desculpa para uma empresa não queira fazer um programa de bem-estar”, Gerra e Costa.
Fonte:
Pesquisa global da consultoria Gallup.
Relatório State of the Global Workplace, 2025.
Ricardo Guerra, CEO do Wellhub no Brasil.
Época Negócios – Futuro do Trabalho.
Silânia Costa, Enfermeira do trabalho/Mundiblue.
