O que você sempre quis saber sobre suas fobias

Temor irracional a coisas ou situações que não são realmente ameaçadoras é um mistério que guarda relação com o fascinante mecanismo mental do medo e seu controle.

Mikel Jaso / EPS.

 

Dizer que as fobias e o coronavírus andam de mãos dadas poderia soar a obviedade, mas será mesmo?

  • Ansiedade por sair à rua (agorafobia)
  • por ficar em casa (claustrofobia),
  • pavor dos germes (misofobia) ou,
  • de ficar doente (nosofobia)…

Como diferenciá-los dos medos protetores, e como entender que às vezes a mente nos induz a procurar aquilo que os causa?

Quando nos deparamos com temores lógicos e razoáveis, mas desmesurados, nossos medos, graças à ansiedade, correm o risco de se transformarem em fobias.

Conscientemente, queremos evitá-los, entretanto, como observou Sigmund Freud, junto com a fobia, frequentemente existe um impulso contrafóbico, que abriga um desejo inconsciente de confrontar e dominar o que se teme, em lugar de fugir daquilo.

Ou seja, estamos em conflito sobre o que tememos.

Um caso pertinente é o do engenheiro Gustave Eiffel, que sofria de acrofobia.

Ele imaginou e desenhou estruturas de considerável altura, como a Estátua da Liberdade, entre os seus primeiros projetos.

Eiffel desafiou a gravidade, e seus medos, ao modificar o desenho original para que pudesse suportar fortes ventos.

Lá do alto, a Torre Eiffel oferece uma das vistas mais prodigiosas de Paris.

Seriam então suas obras uma espécie de mecanismo compensatório mediante o qual ele tratou de lutar contra sua própria fobia de altura?

O escritor Fernando Savater, em um ensaio intitulado Qué significa temblar (“o que significa tremer”, incluído no volume La infancia recuperada), no qual descreve sua predileção pelos contos de terror, detalha que:

“de tanto conviver com esse espectro que leva nosso nome chegamos a nos afeiçoar por ele. Dar espessura e cor à angústia que nos rói de certa forma nos libera dela ao projetá-la para fora; mas, acima de tudo, nos permite vê-la, isto é, admirá-la”.

Como e por que surgem as fobias é algo que continua sendo um mistério.

Quando o medo alcança níveis irracionais, é muito provável que entre em jogo uma combinação de fatores genéticos, ambientais e psicológicos.

Felizmente para quem as sofre, na maioria das vezes há a possibilidade de tratá-las de maneira bem-sucedida, sem necessariamente ter que elucidar sua origem.

A fobia específica com relação a um objeto ou situação (a altura ou voar, por exemplo) causa ansiedades que não guardam relação de proporção com o perigo exposto, causando medo e levando a evitar a situação em questão.

Com frequência a pessoa sofre mais de uma fobia, e elas vêm associadas a ataques de pânico; perduram, diferentemente das ansiedades passageiras, causam reações físicas e psicológicas intensas e podem afetar a capacidade de funcionamento normal na escola, no trabalho ou em ambientes sociais.

Nem todas as fobias exigem tratamento, mas, quando interferem na vida cotidiana, uma terapia pode ajudar a superá-las.

Estudos de ressonância magnética demonstraram dois circuitos cerebrais envolvidos no medo:

  • Primeiro, que o ativa, constituído principalmente pela amígdala cerebelosa, que é parte de uma rede mediadora das emoções e da memória.
  •  Segundo, composto por várias regiões do córtex cerebral, simultaneamente o inibe.

Logo, antes de subir no escorregador, a criança nota uma onda de adrenalina e sente o medo ativado pela amígdala.

Momentos depois, o segundo sistema, que modula a reação de medo, a desliga, controla o temor e permite escorregar.

Este sistema duplo é uma maneira de entender as contrafobias.

Os mecanismos cerebrais do medo são parte do nosso dispositivo de sobrevivência, que detecta e responde ao perigo e ativa a amígdala.

Só que simplesmente ativá-la não basta para gerar uma sensação de medo.

O medo, segundo Joseph LeDoux, professor de neurociências, diretor do Emotional Brain Institute da Universidade de Nova York e pioneiro no estudo das emoções, é uma resposta psicológica que construímos, o resultado de inferências feitas por nosso cérebro.

“Só os organismos capazes de serem conscientes do que está acontecendo podem experimentar o medo. Temos mais controle sobre nossas emoções do que pensamos. As experiências que temos hoje serão as previsões do cérebro amanhã”, observa.

Como é possível que enfrentar a situação fóbica, durante tratamentos de exposição aos fatores desencadeantes do pânico, possa melhorar o comportamento fóbico, se antes o piorava?

Citando Savater, “onde o perigo espreita é que cresce também o que o alivia ou, de forma mais simples, o conhecido ditado latino: (similia similibus curantur) – os semelhantes curam-se pelos semelhantes”.

Quando a ameaça é percebida de maneira consciente e confrontada em forma deliberada, com passos individualizados, manejáveis e escalonados, consegue-se dominar o medo.

Trata-se, por assim dizer, de uma fuga ao contrário, como acontece com as crianças, que gostam de sentir medo num ambiente seguro.

Por outro lado, é menos provável que as fobias com um significado mais complexo como as causadas por experiências traumáticas, respondam exclusivamente a uma terapia de exposição.

Todos temos defesas inconscientes, e é difícil tornar consciente o que foi reprimido, ou desfazer-se delas por conta própria.

Nessa situação, o objetivo é entender a fobia em sua profundidade e modificar os processos mentais que escapam à consciência, como forma de ajudar a modificar o comportamento.

“Não é no mundo que o cerca que o sujeito situa o perigo, e sim no interior do seu próprio psiquismo”, aponta o autor Pierre Mannoni em seu estudo sobre o medo.

 

Fonte:

Joseph LeDoux, professor de neurociências, diretor do Emotional Brain Institute da Universidade de Nova York e pioneiro no estudo das emoções.

Autor Pierre Mannoni em seu estudo sobre o medo.

David Dorenbaum é psiquiatra e psicanalista.

El Pais Brasil.

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