“Não é a idade cronológica que vai decidir isso, mas suas condições físicas e cognitivas”, diz Flávio Emir Adura, 76, diretor científico da Abramet – Associação Brasileira de Medicina do Tráfego, entidade médica sem fins lucrativos, fundada em 1980”

Geraldo Magella de Barros, 84 anos, meu sogro, dirige desde que tirou sua habilitação, quando tinha 28 anos.
Diariamente, ele pega a picape Strada cabine dupla e vai até o centro de Ubá, município de cerca de 100 mil habitantes na Zona da Mata Mineira.
Estaciona sempre no mesmo lugar, segue a pé até o banco para tirar o extrato, faz uma fé na loteria, passa na farmácia para repor o estoque de remédios e finaliza o tour com um café entre amigos na lanchonete.
Duas vezes por semana, também dirige até o sítio Rancho Fundo, onze quilômetros distante de casa, onde cria um gadinho, como dizem lá em Minas.
Tanto na cidade quanto no sítio, se exercita com caminhadas breves.
A lataria da picape tem uns danos aqui e ali, mas Magella, como é conhecido, não se preocupa com isso.
“Dirigir é uma rotina; nada hoje me impede”, me disse numa conversa recente.
O tema desta coluna nasceu de uma preocupação do seu filho, meu marido, que outro dia me instigou com a pergunta:
- “Até que idade o meu pai pode dirigir com segurança?”
Como eu não tinha a resposta, fui em busca de quem a tem.
Flávio Emir Adura, 76, diretor científico da Abramet – Associação Brasileira de Medicina do Tráfego, entidade médica sem fins lucrativos, fundada em 1980.
“Não é a idade cronológica que vai decidir isso, mas suas condições físicas e cognitivas”, diz Adura, que acaba de liderar a confecção da diretriz “Mobilidade e Condução Veicular da Pessoa Idosa”, publicada em maio pela Abramet.
O documento é taxativo: “Pessoas idosas valorizam a atividade de dirigir, pois conduzir um veículo favorece o vínculo com a comunidade e traz a percepção de autonomia e independência”.
A preocupação, diz Adura, não é excluí-las das ruas, mas inseri-las com segurança.
O médico insiste nos benefícios psicológicos de manter o idoso na direção enquanto for possível, embora nos pareça muitas vezes que eles estejam correndo (e provocando) riscos.
“Não dirigir significa uma das perdas mais dolorosas para o idoso.” Segundo ele, a revisão bibliográfica feita para elaborar a diretriz encontrou referências mostrando que o afastamento do volante é associado à perda da independência, casos de depressão, baixa autoestima e redução da mobilidade.
O fato é que meu sogro se sente seguro para continuar dirigindo.
Há alguns anos, Magella fez a cirurgia de catarata e recuperou a visão.
Quanto à audição, tem recomendação médica para usar aparelho auditivo, mas teve dificuldades de adaptação e desistiu.
“Estou bem”, diz.
Eventualmente, se arrisca em distâncias de até 50 quilômetros na região de Ubá e, se pega a estrada à noite, garante que mantém uma velocidade 20% a 30% abaixo da regulamentar.
Para distâncias maiores, contrata um motorista porque, afirma, não prestar atenção às placas com o limite de velocidade e é pego pelos pardais.
Ao renovar a carteira no ano passado, foi submetido ao exame oftalmológico de praxe e a umas perguntas rápidas e insignificantes (o Contran tem um modelo de questionário que indaga, entre outras coisas, que remédios a pessoa toma e se já sofreu acidentes de trânsito).
Magella ganhou mais 3 anos ao volante, como prevê a lei nos casos de pessoas com mais de 70 anos (o médico pode reduzir o tempo se achar que deve).
Mas o que meu marido e outros filhos preocupados com seus pais ao volante devem fazer?
“A família deve se preocupar e observar; recomendo ir junto de vez em quando para verificar se há sinais de perda cognitiva”, diz Adura.
Alguns sinais preocupantes seriam:
- cometer infrações inconscientes, como furar semáforos, e demonstrar dificuldade de ultrapassar caminhão ou de fazer conversão à esquerda, que exigem mais atividade cerebral.
Na dúvida, o médico a ser procurado é o especialista em medicina do tráfego, mas o geriatra e o neurologista também podem ajudar com as questões cognitivas.
“Enquanto houver segurança, o idoso deve dirigir.”
Fonte:
Época 50+ Vida e Trabalho.
Mundiblue.